O OUTONO DOS POETAS

 
SE DESTE OUTONO
 
Se deste outono uma folha,
apenas uma, se desprendesse
da sua cabeleira ruiva,
sonolenta,
e sobre ela a mão
com o azul do ar escrevesse
um nome, somente um nome,
seria o mais aéreo
de quantos tem a terra,
a terra quente e tão avara
de alegria.
 

 Eugénio de Andrade
 
OUTONO
 
No entardecer da terra,
O sopro do longo outono
Amareleceu o chão.

Um vago vento erra,
Como um sonho mau num sono,
Na lívida solidão.
 
Soergue as folhas, e pousa
As folhas volve e revolve
Esvai-se ainda outra vez.
Mas a folha não repousa
E o vento lívido volve
E expira na lividez.
 
Eu já não sou quem era;
O que eu sonhei, morri-o;
E mesmo o que hoje sou
Amanhã direi: quem dera
Volver a sê-lo! mais frio.
O vento vago voltou.
 
 
Fernando Pessoa
 
OUTONO
Outono vem em fulvas claridades...
Vamos os dois esp’rá-lo de mãos dadas:
Tu, desfolhando as rosas das estradas,
E eu, escutando o choro das saudades...

Outono vem em doces suavidades...
E a acender fogueiras apagadas
Andam almas no céu, ajoelhadas...
E a terra reza a prece das Trindades.

Choram no bosque os musgos e os fetos.
Vogam nos lagos pálidos e quietos,
Como gôndolas d’oiro, as borboletas.

Meu Amor! Meu Amor! Outono vem...
Beija os meus-olhos roxos, beija-os bem!
Desfolha essas primeiras violetas!...
 
 
   Florbela Espanca
 
(...) E as mãos começam a tremer um bocadinho. E o trabalho começa a ser mais custoso. E um dia a gente já quase que não conhece a nossa cara no espelho no lavatório. É nesse dia, é nessa hora que começa o outono.(...)

José Luís Peixoto, in 'Cal'